Pedaços do Ele e do Ela


Dueto com Fábio Ramos


Ela se cerca de palavras clássicas ao vento,
Forma frases sem ter com quem conversar.


Ele enxerga alguém no espelho
E esse alguém está sempre lá.


Ela gosta de Pessoa nas horas de solidão,
Mas Machado a faz sair da melancolia.


Ele preso ao passado, já pensando na separação,
Age como Vinicius, que remói em agonia.


Ela lê Camões, é apaixonada por sonetos,
Que a induz a efêmeros estados de percepções.


Ele vê o drama, reproduzido nos livretos.
Tantos personagens e manjadas repetições.


Ela se sente emocionada quando vê o livro do vizinho,
Equilibra-se frente aos romances que trazem lágrimas.


Ele, entre as páginas, buscando um caminho.
Sozinho e praguejando... Que lástima!


Ela era intrigada pela roupagem intangível de Homero.
E as epopeias Ilíada e Odisseia, seriam mesmo de um só poeta?


Ele, tão amargurado, com esse olhar austero.
Aperta a rosa e o espinho que espeta.


Ela, tão dividida entre o racional e o emocional,
Mergulha em si mesma e depois chora de prazer.


Ele, cansado da lamúria habitual,
Supera as tribulações e permite-se viver.


Ela rejeita ser igual aos automáticos ao redor.
Importa-se com as viagens que faz em seu interior.


Ele escolheu projetar o seu melhor.
Exprimindo o que escondia do mundo exterior.


Ela degusta, numa tarde fria, um café bem quente,
E contempla a pintura de Modigliani que retrata Jeanne.


Ele, no afã de interagir com outro ser vivente,
Sai à rua e o resto que se dane!


Ela, em sua pequena residência,
Quis ouvir Beethoven e escrever poesia.


Ele é impulso, ele é urgência.
Mas cadê o amor? Cadê a cortesia?


Ela, mergulhada em sua ventania interior
Quis descansar da barulheira que era o exterior.


Ele sintoniza a frequência superior,
Pedindo bênçãos e uma graça posterior.


Ela conhece ele, e percebe assuntos comuns.
Agora ela tem com quem compartilhar.


Ele é certeza. O todo e nenhum:
A qualquer instante, ela vai chegar.

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